Pages

domingo, 19 de dezembro de 2010

Conto- Os mortos também sabem brincar.

         O garoto observava cautelosamente a figura feminina sentada em sua frente. Os longos cabelos castanho-dourados da menina pareciam reluzir com apenas um risco de luz solar, que dificilmente penetrara pela janela, desviando da grossa cortina escura. Sua pele branquinha e rosada parecia atrair o toque masculino daquele que observava. O garoto imaginava aqueles olhos inocentes, embora estivesse mantendo apenas uma visão de trás, ele conseguira memorizar os orbes azuis penetrantes da menina, desde a chegada dela na sala até o momento em que sentou-se na carteira, deixando que o garoto usufruísse apenas parte de sua beleza.
        Atento aos mais simples movimentos da garota, ele podia sentir a sua respiração descompassada. O jovem estava estático com tanta beleza. Sua absurda atenção não demorara a ser notada pela possuidora de tais elogios. Relutante, ela olhou de soslaio para a figura sentada atrás. O garoto, percebendo que sua presença fora notada, voltou o olhar para o lado, onde deparou-se com a paisagem que formava-se além das janelas da sala de aula. O tempo fechou-se rapidamente; nuvens negras começavam a dominar o céu, e um forte estrondo soou pelos terrenos da escola, começara, então, uma tempestade.
        “Esse tempo...” – O garoto pronunciou mentalmente, enquanto focava sua atenção no clima, que acabara de se formar. Parecia estar atento a certas lembranças. Expressões perplexas começavam a tomar conta de seu rosto, e então, voltou o olhar novamente para a figura em sua frente, encarando-a, enquanto encontrava-se espantado e confuso.
       O sinal tocara, despertando o garoto de seu transe. Ele sacudiu a cabeça, e lançou um olhar para frente, avistando a garota ir ao longe. Ele levantou-se automaticamente, pondo-se na direção da menina. Porém, ao sair da sala, acabara em perdê-la de vista. Ofegante, começou a procurá-la em todos os cantos, desesperadamente. Ele percorria desastradamente um caminho entre o amontoado de alunos, esbarrando em alguns, sem preocupar-se em se desculpar.
        Acabara de entrar no corredor oeste, quando finalmente avistou a figura feminina no final do mesmo. Um gemido saiu abafado da boca do garoto, seus olhos arregalaram-se, e suas expressões eram de um terror avassalador, ao ver que ao lado da menina, jazia um cadáver pendurado na parede. O corpo sem vida, que encontrava-se com a farda da escola, parecia ter sido banhado em sangue, e era possuidor de curtos cabelos pretos e lisos, expressões femininas e pele pálida. A garota soltou uma gargalhada alta e maldosa, que propagou-se por todo o corredor, este que antes estava lotado encontrava-se agora com apenas três presenças. O garoto lançou um olhar assustado para a menina, percebendo a substituição de seus olhos inocente e azuis por orbes flamejantes e vermelhos, uma mistura de sangue e chamas.
           -Vamos, Joe. – A menina pronunciou asperamente. –Venha buscar sua namoradinha. -  Ela lançou um olhar enojado para o cadáver ao seu lado. – Não foi por “Isso”... – A menina levantou o braço sem vida do corpo, depois o deixando cair. – Que me deixou?
          -Maureen... C-como? – O garoto gaguejou abismado, caindo de joelhos no chão.
         -Lembra-te, Joe? – Ela voltou seu olhar para a aterrorizante paisagem do lado de fora. – Foi exatamente em um clima como esse que você me deixou morrer! – Ela pronunciou entre dentes, fechando os punhos. – O que foi? Nunca viu um fantasma antes? Pois é, eles existem.- Ela voltou-se para o garoto ajoelhado no chão.
       -Eu n-não te matei. – Ele murmurou com dificuldade. – Foi um acidente de carro, Maureen!
      -Cujo causador fora você! – Ela completou gritando alto e firme, enquanto apontava para o garoto em sua frente. Tal irritação fez com que as portas dos armários abrissem e, depois fechassem com um estrondo. – E depois da minha morte, você logo achou algo para me substituir. – Ela lançou um olhar fulminante em direção ao cadáver. – E olha! Você nem me reconheceu de primeira quando entrei naquela maldita sala! – A menina novamente gritou, fazendo com que as luzes do corredor piscassem, e depois, repentinamente, apagarem; mergulhando o corredor em uma imensa escuridão.
       O garoto estremeceu-se, encolhendo-se no seu casaco. Um ruído leve e inocente começara a propagar-se pelo corredor. Parecia uma canção, cantada lentamente: “La, La, La, La.” O garoto olhava para todos os lados, forçando sua visão, mas era inútil.
        -Joe? Eu te perdôo. – A voz soou doce e calma próxima ao garoto, mas este não conseguia conhecer sua origem. – Agora podemos passar a eternidade juntos! Você só precisa... Bom, morrer. – A voz finalizou grossa e assustadora, seguida de um forte estrondo, causado pela forte tempestade.
        Um arrepio percorreu todo o corpo do garoto. Ele entrara em estado de choque; enquanto olhava fixamente para frente, avistou apenas os olhos de Maureen na escuridão, que reluziam como duas tochas. Ele soltou um grito abafado, deixando-se cair para trás, arrastando-se para longe à medida que aquela doce, porém aterrorizante figura aproximava-se. Quando fora impedido de prosseguir ao esbarrar em algo.
        -Oh, Joe! Eu pedi uma ajudinha de sua namorada cadáver; espero que não se importe. – A garota fantasma comentou com desdém.
         O garoto sussurrou: “Jammie”, enquanto relutante olhava para cima, onde, apesar da escuridão, conseguiu ter a visão do rosto deformado e coberto de sangue da sua nem tão viva namorada.
        Aquela dolorosa visão fez com que Joe recuperasse o fôlego, e começasse a gritar freneticamente. A sua até então namorada zumbi o agarrou, e os dois, junto a Maureen, começaram a afundar em um buraco negro que surgira no chão. E assim, os três mergulharam na escuridão, desaparecendo; Deixando apenas, por alguns segundos, os gritos de desespero de Joe, ecoando pelo corredor.
         As luzes voltaram ao corredor, assim como os alunos. O lugar estava intacto, sem nenhum objeto quebrado, e sem nenhuma gota de sangue. Da mesma forma, inesperada e repentina, como surgiu, a tempestade cerrou.
          “La, La, La, La... Não devemos brincar com os mortos, eles podem aceitar o convite e participar da brincadeira também”
            By: Valéria c.

1 comentários:

Teknik Informatika disse...

Como o narrador descreve a figura feminina no início do conto e qual é a reação do garoto em relação a ela?
Regard Telkom University

Postar um comentário